Análise Petrobrás – Anual 2024 e Trimestral
A notícia do prejuízo de R$ 17 bi da Petrobrás no 4o tri já trouxe diversas especulações.
É efeito da política de preços?
É ineficiência?
Para ter uma ideia do que aconteceu, peguei os balanços anuais e trimestrais e fui dar uma olhada.
Antes:
“Você sempre usa os anuais!! Usar trimestral justo na PETR é MUITO SUSPEITO!!”
Calma, eu explico.
Isso é porque o anual fechou no lucro.
O prejuízo foi no 4T de 2024, então para ver o que aconteceu eu peguei 2 anos de trimestrais.
Nos anuais, eu usei de 2020 a 2024.
Começo pelo anual.
Batendo o olho, já dá para ver uma coisa: a empresa fechou com lucro em 2024, porém com uma queda enorme em relação a 2023 (-70%).
De onde vem essa queda?
Como são vários anos, eu fiz a análise horizontal separada das principais contas.
Apesar da queda da Receita e aumento do CMV, impactando na eficiência produtiva, a margem ano a ano caiu menos do que seria esperado, se o prejuízo viesse da política de preços (-2,5 pp).
A evolução das despesas, por outro lado, é assustadora.
As despesas totais vêm crescendo desde 2022.
Quando pegamos a velha conhecida (Despesas com Pessoal), temos um aumento de 15,5% em 2023 e 25,2% em 2023.
Contratações tiveram destaque na Nota Explicativa.
Mais dois pontos chamam a atenção, em Outras Despesas Operacionais:
1) Resultado relacionados ao desmantelamento de áreas
2) Plano de pensão e saúde (inativos).
Abaixo a Nota Explicativa referente a estas despesas.
As despesas financeiras também cresceram pelo segundo ano consecutivo, sendo que de 2023 para 2024 cresceram em 64%.
“ENTÃO OS BANCOS ESTÃO EXTORQUINDO A PETROBRÁS?”
Não, não é isso. Despesas com financiamentos não subiram tanto.
O principal veio da adesão a uma transação tributária.
Resumo dessa primeira parte:
A Petrobrás deu lucro em 2024, mas o resultado foi péssimo.
“COMO ASSIM?”
É só olhar a evolução das margens.
1) A empresa perdeu margem bruta.
2) A margem operacional está caindo desde 2022.
3) A piora no resultado financeiro fez com que a Margem EBT (Earnings Before Taxes) fosse a pior desde 2021.
4) A Margem Líquida ficou em míseros 7,5%.
“MAS A PRESIDENTE FALOU QUE ISSO NÃO TEM NENHUM IMPACTO NO CAIXA, É VERDADE?”
Meia verdade. Vamos ver o DFC.
Primeiro: Ok, a empresa gerou caixa operacional. A geração não foi muito diferente de 2023.
Ou seja: o prejuízo do 4T (e o lucro baixo do ano) não teve efeito catastrófico no caixa – obviamente que se quanto maior o lucro, mais caixa geraria.
“COMO ISSO É POSSÍVEL?!”
Porque algumas despesas (e custos) não tem efeito caixa.
Destaquei no print as principais:
Depreciação, impairment e variações cambiais não realizadas.
Não, isso não quer dizer que está tudo certo.
Uma das críticas é que a PETR voltou a investir pesado (veja o FCI, que consumiu R$ 72,3 bi de caixa).
Se os investimentos não forem feitos de forma eficiente, não vão gerar retorno e isso vai pressionar ainda mais o resultado.
Além disso, o risco de voltar a aumentar a dívida não pode ser descartado – ainda mais se a margem continuar em queda livre.
Por enquanto, a dívida segue controlada e em ritmo de amortização.
Prejuízo sempre acaba chegando no caixa.
E o prejuízo de R$ 17 bi?
Está no trimestral.
O lucro dos outros trimestres absorveu, por isso no anual não aparece.
Para ver isso, eu montei um DRE desde o 1T2023 até 4T2024.
Para começo de conversa:
O prejuízo da Petrobrás no 4o trimestre de 2024 foi o pior dos últimos 2 anos.
Aliás, o único outro prejuízo trimestral foi no 2o tri de 2024 (R$ 2,5 bi).
Isso é assustador. Não preciso dizer que R$ 17 bilhões é muita grana.
A visão trimestral dá um sinal um pouco diferente das margens.
Vejam que a margem vem em queda do 1T2023 (52,7%) até chegar em ~48% no 4T2024.
Isso pode, sim, ser efeito de uma mudança na política de preços para conter a inflação – o custo corrige, a PETR não repassa 100% do aumento, por exemplo.
Isso é o suficiente para justificar o prejuízo de R$ 17 bi?
Nem de longe. Inclusive, conversando com um amigo do setor, ele me explicou o seguinte:
No passado, boa parte do prejuízo foi na distribuidora, que importava derivados e vendia abaixo do custo. Agora, sem a BR Distribuidora, tem que segurar na refinaria, e o efeito é bem menor.
“ENTÃO CADÊ O PREJUÍZO?”
Vamos ver, focando nos últimos 2 tri.
Destaquei os 3 principais pontos que vão dar a lógica da análise.
1) A margem bruta caiu 3,4 pp.
2) A margem operacional caiu 23,5 pp.
3) A margem de lucro antes de impostos caiu 52,6 pp.
Ou seja, na ordem:
1) Tem um problema relativamente pequeno na eficiência de produção ou no repasse de preços.
2) Tem um problema grande operacional, nas despesas operacionais.
3) Tem um problema também grande em despesas financeiras. Do problema 1 já falamos acima.
Vamos ver os outros.
À primeira vista, parece ter uma sazonalidade nas despesas operacionais, e aí a sugestão seria analisar 4T24 vs 4T23.
Porém, isso é muito concentrado em Outras Despesas.
O principal ponto aí é um aumento nas despesas para desmantelamento de áreas devido à revisão de provisão de campos com aprovação de devolução.
Nas despesas financeiras essa impressão de sazonalidade não acontece.
Se olharmos 4T24 vs 4T23, as despesas operacionais aumentaram em 32%, portanto bem acima da inflação.
Os principais?
Outras despesas (já explicado – o resultado relacionado ao desmantelamento de áreas triplicou entre o 3T23 e 3T24) e custo com exploração e pesquisa.
Isso não muda muito ao olhar a evolução do 3T24 para o 4T24.
A principal variação é na mesma conta, e pela mesma razão.
“MAS O QUE É ISSO?”
O desmantelamento de unidades é uma atividade obrigatória quando elas são desmobilizadas (uma plataforma que chega ao fim de sua vida útil, por exemplo, ou todos os equipamentos de um campo que parou de produzir).
Quando a empresa abandona uma área, tem que devolver como se nada tivesse ocorrido ali nos últimos 40 anos.
“Mas eu li que são não-recorrentes. Então tudo bem. NÉ??”
Hm, não.
Isso é algo que vai ser cada vez mais recorrente a partir de agora devido ao ciclo de vida dos campos da Petrobrás.
Ou seja: vai ser necessário fazer isso de forma mais eficiente, ou então gerar resultado em outras contas para cobrir essa despesa.
A terceira questão é a despesa financeira.
Essa é simples:
O principal impacto foi de variação cambial – se olhar no DFC, não teve efeito caixa.
Os custos com desmantelamento também foram revertidos, pois também não tiveram efeito no caixa – ainda.
RESUMO da Petrobrás:
Ambos os resultados foram ruins.
As margens estão em queda em todos os cenários, e as despesas subindo rapidamente.
Dizer que o prejuízo “não impacta no caixa” é uma meia-verdade.
Apesar do desmantelamento não ter tido efeito no caixa ainda, esse gasto não deve ser tratado como despesa não-recorrente.
Dizer que um gasto é “não-recorrente” é um padrão de quando a gestão quer justificar resultado ruim. É o que leva aos famosos “EBITDA Ajustados”.
O prejuízo em algum momento chega no caixa – seja por realização das provisões, seja por investimento em capital de giro (consumo de caixa), seja para reposição de ativos que a empresa não consegue financiar com geração de caixa.
Vamos ver as cenas dos próximos capítulos.